domingo, 26 de agosto de 2007

Paciência

A falta do que escrever. Perdão, não é assunto que falta, é jeito mesmo. Assunto tem aos montes, nunca vão esgotar-se. Mas antes disso tem o bloqueio. Simplesmente não sei como dizer, porque as palavras são cruéis. Não basta serem escritas, elas têm que falar por si só. Ler não é o suficiente, é preciso entender e entender também não basta, é preciso sentir. Então, encontro-me na frente do computador com o cursor de texto piscando na tela, como quem bate os pés para apressar os outros: "Vamos, estou esperando". Ai, quanta pressão! Pisca, pisca, pisca. E me surpreendo quase em estado de hipnose olhando o cursor aparecer e desaparecer, de novo e de novo, outra vez e mais outra... Chega! Você venceu, vou começar! Anda cursor, anda e vai deixando as letrinhas, uma por uma, uma atrás da outra, enfileiradinhas, opa! Ponto final, vírgula. Escreve escreve escreve. Mas afinal, quem escreve? Eu, ou esse pedacinho de linha aí metido à besta? Ih, que lixo de texto, como você escreve mal! Volta cursor, volta tudo isso aí. Pensando bem até que você é simpático, vou te chamar de Bentinho, que é apelido de Beto, que vem de alfabeto, que é da onde saem todas as letras. Só não o chamo de Alfa porque ficaria muito óbvio, mas é claro que considero só uma das funções de Bentinho, pois também é dele que saem os números, os sinais de pontuação, acentos e outros símbolos que não sei para que se usa. Mas chega de bobagem. Agora vamos escrever. É... Ah... Bentinho, não me olhe assim, estou pensando! Pisca pisca pisca. "Vai ou não vai?" - diz ele. Ok, você venceu! Bentinho Mirradinho... Toco de linha mais insolente! Já vi que hoje terei que recorrer à velha caneta e ao papel. Pensando melhor, acho que eles mereciam nomes também, por serem bem mais pacientes que Bentinho.

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Queria pedir desculpas pelo meu último post. Odeio ficar poética. Mas existem características, das quais não gostamos e por mais que tentemos reprimi-las, sempre acabam vindo à tona, de uma ou de outra forma. Na verdade a desculpa que eu peço é quase para mim mesma, por demonstrar insegurança, fraqueza, desespero. Isso fere demais o meu orgulho inútil. Fazer o quê se muitas vezes não consigo ser sensata nem racional? Besteira minha achar que ser tudo isso alivia a dor, o que me torna ainda mais ridícula, pensar a dor, imagine! O pior defeito do ser humano é se achar superior por ter a capacidade de pensar. Sermos racionais, só nos traz angústia, pois pensar nos permite compreender que temos limites. Não aceitamos nem queremos isso. Quer ir à Lua? Vamos. Quer adiar a morte? Adiamos. Quer construir o mundo? Construímos. Quer ser imortal? Um dia, quem sabe. O humano não se enquadra na natureza, ela não basta. E cada um vai andando para uma direção, completamente descoordenado, procurando não sei o quê para justificar a vida e ter um bom motivo pelo qual continuar, mas não sabem usar o raciocínio e acabam por se destruir e destruir o mundo achando que estão fazendo a coisa certa. É aí que entra a emoção, ou a depressão. Mas o que eu fiz de errado? - eles perguntam. E você não sabe, senhor animal racional? - eles respondem. Como eu pude ser tão cego? (você não quis ver), como eu pude errar tanto? (você não pensou certo), como não percebi antes? (você não prestou atenção). Depois que tudo acontece, toda e qualquer situação transforma-se no óbvio que ulula (como diria Nelson Rodrigues) e flutua diante de nossas córneas. Tudo torna-se claro. "Por que não notei antes?" Então vem a fase da dor e da mágoa, onde a pobre criatura sente pena de si mesma, tal auto-compaixão deprimente vira raiva e ódio, por tudo e por todos.
Percebendo que a fúria não muda nem leva a nada, ela transforma-se em depressão, onde o ódio não é contra os outros, mas contra si mesmo. Depois de constatar que a sua existência de nada vale, vem a redenção e o lamento, que não é sentir pena nem ódio, mas desistir completamente, sentindo-se o ser mais imprestável que existe por não saber resolver nem mesmo os próprios problemas. Ô serzinho mais contraditório, sempre querendo impor a razão aos seus instintos, vai estudando, vai refletindo, vai procriando, vai trabalhando, vai criando, vai vivendo escravo das suas emoções!

sábado, 11 de agosto de 2007

Desilusão


Faz-me mais patética
Mais concreta
Mais ridícula
Mais anoréxica

A importância
que tanto almejo
é veneno

Contento-me com a companhia
Mas aquela verdadeira
se estiver aqui,
escute bem: esteja

É pedir demais?
Um minuto que seja?

Eu não quero amor
nem compaixão
nem mágica
desapareceu!

Será que foi um sonho?
Ou é sonho que me falta?
Ou falta faz o sonho?

Ai, minha nossa, eu perdi tudo
Só me restaram essas coisas inúteis
ou a inútil sou eu em não conseguir fazê-las úteis?

Até a esperança...
a esperança que nunca se perde
Até a vontade,
a vontade que me move

Ai, José, José...E agora?
Por que não me disse antes que eu era a enganada?
Que eu era a traída, a iludida, a descartada?

É sua culpa! Só sua, droga!
Hoje não sou nada
E mesmo tendo horror aos meus versos,
tarde demais, arrisco na poesia:

Estando sob a montanha
Debaixo da mesa
Debaixo da cama
Nada resta
Nada me chama

Outro dia ouvi falar
em perseverança e ignorei
Oh, Deus, e agora?
Sem meu dicionário, como saberei
o significado de esperança?

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Clínica

_Menina, onde você anda com a cabeça?

Mas eu nunca ando com a cabeça, sr. senhor! Pensa só se eu dissesse isso a ele. (consegue contar quantos "ésses" têm na frase anterior?) Já reparou que as vogais são as únicas letras que a gente não consegue escrever por extenso? Existe escrever letras por extenso? Se escrevê-las já é escrever. Nove "ésses"! Imagine se o "ésse" fosse a única consoante do alfabeto? "Sessa só se eu sissesse isso a ese"...

_Eu desisto! Você vive com a cabeça nas nuvens!

Eu siso sos a sasesa sas susess? Fiquei imaginando a cena do meu corpo com a cabeça nas nuvens... Figura um pouco assustadora: o meu pescoço seria muito longo e fino, assim como o das girafas. Mas eu não preciso ser uma girafa para viver com a cabeça nas nuvens segundo o sr. senhor. Se eu fizesse alongamento no pescoço todo dia, quem sabe poderia fazê-lo crescer, assim como a teoria de Lamarck (era mesmo de Lamarck?) e os meus descendentes também herdariam o meu pescoço gigante. Que loucura essa de Lamarck...Pior o sr. senhor perguntando onde eu ando com a cabeça...

Sr. senhor não entende, ele não sabe das coisas. Ou talvez eu não seja muito boa em me fazer entender. Mas não gosto da maneira como ele classifica as coisas e de como enxerga o mundo. Tenho muito orgulho e sorte em conservar minha alma fantasiosa, que mundo chato esse! Por que e quando eu peguei o gosto por fazer tudo errado? Talvez seja apenas simpatia pelas coisas ao contrário ou eu só não saiba como fazer o certo. Mas um dia todos vão enxergar o lado bom que existe em mim. "Não, ele não é louco, é um gênio!" Engraçado como tem gente que confunde loucura com genialidade, de tão inteligente ficar louco e de tão louco ser considerado inteligente, na verdade isso não acontece. Mas podemos culpar ou condenar quem perde a noção do mundo? Não, pois a sanidade está diretamente ligada à loucura. Duas coisas totalmente diferentes separadas por uma linha muito frágil e fina, e todos sempre acabam passando por ela. A sanidade é a loucura em estado de transformação. O correto seria manter-se no primeiro lado, e ultrapassar a linha é ser apenas mais um maluco que não pode contribuir para nada na comunidade, linha esta que dizem que transpassei, mas eu nunca a vi, e se vi, não a enxergo mais.